Primeira infância e infância negra: dupla urgência
- Alma Mater Cosméticos

- 1 de out.
- 6 min de leitura
Atualizado: 9 de out.

A infância é o período da vida em que tudo está sendo construído: a identidade, a forma de se relacionar com o mundo, a autoestima. Mas existe uma fase ainda mais decisiva nesse processo: a primeira infância, que compreende os seis primeiros anos da vida, sendo os três primeiros especialmente críticos.
É nesse tempo que o cérebro humano se desenvolve de forma acelerada, formando as bases do que seremos como adultos, não apenas no aspecto intelectual, mas também emocional, social e até mesmo ético. O que a criança vive nesse período deixa marcas profundas. O afeto recebido (ou negado), os estímulos, a escuta, os cuidados com o corpo e com a mente… tudo isso influencia diretamente o desenvolvimento da linguagem, da empatia, da autoestima e da capacidade de lidar com o mundo.
O que é a primeira infância?
Quando falamos em primeira infância (do nascimento aos 6 anos), falamos de uma fase em que o cérebro constrói sua “arquitetura” básica a partir das experiências com o ambiente e com os cuidadores.
Ao falarmos de infância negra, a urgência se multiplica. Além das necessidades universais de qualquer criança, meninos e meninas negros crescem em um contexto atravessado pela cultura do racismo.
Isso significa que, desde muito cedo, podem enfrentar comentários sobre a cor da pele, olhares discriminatórios ou invisibilidade em espaços de poder. Esses episódios, muitas vezes naturalizados como “brincadeiras”, impactam diretamente a formação da autoestima e da identidade.
Pesquisadores explicam que os seis primeiros anos de vida são o alicerce de tudo que a criança será no futuro. É nesse período que o cérebro atinge seu auge de plasticidade. A ciência hoje é categórica: nos primeiros anos de vida se formam mais de 1 milhão de novas conexões neurais por segundo, um ritmo que não se repete depois.
Essas conexões são fortalecidas por interações responsivas e podem ser prejudicadas por estresse tóxico (exposição prolongada a adversidades sem proteção de um adulto estável), que altera circuitos cerebrais e aumenta riscos para aprendizagem, comportamento e saúde ao longo da vida.
No Brasil, especialistas como Dandara de Oliveira Ramos, psicóloga e epidemiologista, mostram que não é apenas uma questão de estímulo cognitivo, mas também de condições sociais e raciais: crianças negras enfrentam, desde cedo, barreiras que afetam sua saúde, autoestima e acesso a oportunidades. Se os estímulos são positivos, fortalecem empatia, linguagem e confiança; se são atravessados por estresse tóxico e racismo, podem deixar cicatrizes emocionais que acompanham a vida adulta.
Estudos conduzidos pelo Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI) reforçam que experiências nos primeiros anos impactam desempenho escolar, relações sociais, oportunidades de trabalho e até a saúde física ao longo da vida. Em outras palavras, o que acontece na infância não fica na infância: floresce, ou fere, para sempre.
É por isso que iniciativas como a estratégia Primeira Infância Antirracista (PIA/UNICEF Brasil e Instituto Promundo) alertam para a urgência de que o cuidado seja também um ato de justiça racial: acolher, proteger e valorizar cada criança é construir uma sociedade mais justa e sustentável.
O Marco Legal da Primeira Infância e o que ele muda na prática no Brasil
No Brasil, essa urgência foi reconhecida pela Lei nº 13.257/2016, o Marco Legal da Primeira Infância. A legislação aponta que cuidar dessa etapa é cuidar da humanidade. Mas, como lembram os especialistas, lei sem prioridade é só papel e infância sem proteção vira ferida. É preciso que famílias, escolas, serviços públicos e comunidades sustentem, juntos, um ambiente de afeto, segurança e valorização da identidade negra desde o berço.
O Marco Legal da Primeira Infância definiu como prioridade de Estado o cuidado integral das crianças até 6 anos, alinhando saúde, educação, assistência, cultura, saneamento e proteção contra violências. A lei estabelece princípios e diretrizes para políticas públicas e reconhece oficialmente esta janela como crítica para o desenvolvimento humano. É, portanto, a tradução jurídica do consenso científico: cuidar da infância é cuidar da humanidade.
No campo dos indicadores nacionais, plataformas de monitoramento reúnem dados municipais sobre mortalidade infantil evitável, amamentação, vacinação, educação infantil, violência, entre outros — mostrando onde estão os gargalos e onde políticas locais já estão fazendo diferença. Para além do diagnóstico, essa transparência orienta decisões de gestores e sociedade civil.
Um lembrete importante que dialoga com a nossa missão na Alma Mater: quando olhamos para infância negra, essas políticas precisam ser antirracistas por desenho, garantindo acesso real a creches e pré-escolas de qualidade, acolhimento na atenção básica, saneamento digno e ambientes de cuidado (em casa, na escola e na comunidade) que reforcem identidade, autoestima e pertencimento desde o berço.
Sem isso, a janela de oportunidade vira janela de reprodução de desigualdades. E a ciência mostra que não precisa ser assim: com cuidado nutridor, interação responsiva e redes de proteção, o desenvolvimento acelera e os efeitos do estresse se atenuam.
Por isso, cuidar da primeira infância negra é também um ato político e de justiça social. É ensinar que o cabelo crespo infantil é belo, que a pele é motivo de orgulho, que a história da família e da comunidade é digna de reconhecimento. É oferecer referências positivas, narrativas diversas e representatividade em brinquedos, livros, músicas e desenhos.
Infância negra: Cuidar vai além do amor
Às vezes, quando falamos em primeira infância, pensamos apenas em “dar amor”. Mas o cuidado é mais profundo. Ele envolve presença, segurança, estímulo, escuta atenta e respeito. Uma criança pequena precisa de vínculos fortes para aprender que o mundo é um lugar confiável. Precisa de estímulos para desenvolver a linguagem, a coordenação, a criatividade. Precisa de reconhecimento para formar uma autoestima sólida.
E quando isso falta? Não é o tempo que cura, é o trauma que cresce.
Uma criança que sofre negligência, falta de afeto ou exclusão precoce pode carregar marcas invisíveis que se refletem em dificuldades de aprendizado, insegurança, baixa autoestima e até problemas de saúde mental na vida adulta. O que se planta nos primeiros anos floresce, ou fere, por toda a vida.
Quem sustenta esse começo de vida
O cuidado não acontece em uma bolha. É sustentado por diferentes camadas:
O lar, onde cada gesto cotidiano, desde o banho até o cuidado com os cachinhos, é também uma forma de construir pertencimento.
Os serviços de saúde, que precisam estar preparados para atender com qualidade, sem vieses racistas.
A escola, que deve ser espaço de valorização e não de exclusão, com práticas pedagógicas antirracistas desde a educação infantil.
A vizinhança e os espaços coletivos, que podem ser lugares de proteção e convivência ou, ao contrário, de ameaça e invisibilidade.
Quando uma sociedade investe na primeira infância, todos ganham. Crianças mais saudáveis e estimuladas se tornam adultos mais capazes de contribuir para comunidades prósperas e solidárias. Mas, quando falhamos nesse cuidado, o custo é coletivo: mais desigualdade, mais exclusão, mais violência.
Por isso, o cuidado com a primeira infância precisa deixar de ser apenas responsabilidade das famílias e se tornar prioridade de governos, empresas e instituições.
Leia também:
Um recado às mães, pais e cuidadores

Este não é apenas um texto sobre desenvolvimento infantil. É também um recado a você, que carrega nos ombros a tarefa de proteger uma criança negra.
Quando você canta uma canção de ninar, quando responde a uma pergunta difícil com paciência, quando ensina seu filho a amar sua pele e seu cabelo, você está plantando sementes que podem durar para sempre.
Se você é mãe, pai ou cuidador, esta é uma carta de amor para você: Nunca subestime a força do que você faz hoje. Cada palavra, cada abraço, cada cuidado com os cachos do seu filho ou filha estão construindo muito mais do que o presente. Estão moldando o futuro.
Proteger a primeira infância negra é plantar sementes de autoestima e pertencimento que florescerão por toda a vida. É dar às nossas crianças o direito de sonhar grande, sem que o racismo, a exclusão ou a falta de cuidado limitem suas asas.
E mesmo nos dias de cansaço ou incerteza, lembre-se: cada gesto importa. Sua presença hoje é o maior investimento no futuro da sua criança.
Na Alma Mater, acreditamos que cuidar da primeira infância é também cuidar da nossa humanidade. Por isso criamos a linha Meu Crespinho Baby, feita com fórmulas seguras e naturais que transformam o cuidado capilar em autoestima desde o berço.
Porque infância saudável é infância amada, cuidada e respeitada em todas as suas raízes.

por Simone Aguiar
Diretora Executiva na Alma Mater Cosméticos
Simone é mãe, avó e farmacêutica, graduada pela UFRGS. Atua no mercado de cosméticos há 40 anos, tendo desenvolvido mais de 100 formulações comerciais ao longo de sua carreira como consultora e colaboradora em grandes empresas como Biolab Farmacêutica, Body Store, The Body Shop/Natura.



Comentários